SUL X NORTH – POR BRUNO DE ALMEIDA

Galeria Leme tem o prazer de apresentar a terceira exposição individual de Felipe Cama na galeria. Em “Sul X North” o artista aprofunda o seu interesse pela imagem digital, continuando a sua exploração sobre o seu estatuto ambíguo enquanto matriz de uma experiência de visualidade, assim como dos seus modos de difusão, circulação, reprodução e consumo. 

Nesta nova série, o binômio computador-internet continua sendo o eixo central das obras, tanto do ponto de vista instrumental como de uma fonte de matéria-prima para os trabalhos. A exposição não se refere exclusivamente às possibilidades e limitações inerentes à natureza dos meios digitais e eletrônicos, mas também questiona o problema da representação de imagens da histórias da arte através destes mesmos canais.

Para melhor articular este paralelo entre duas formas de produção e apresentação de imagem, Felipe Cama se debruça, por um lado, sobre a obra da artista-viajante, Marianne North (1830–1890), e por outro, se apropria de diversas fotos postadas na internet de turistas anônimos. 

 
Vista da exposição “Sul x North” na Galeria Leme, agosto de 2015.

Vista da exposição “Sul x North” na Galeria Leme, agosto de 2015.

 

North, naturalista e botânica inglesa, foi uma mulher pioneira para o seu tempo. Artista-viajante, começou suas excursões em 1871, indo primeiro ao Canadá, Estados Unidos e Jamaica, e finalmente residindo, durante um ano, no Brasil, onde realizava seu trabalho em uma cabana no interior de uma floresta. A artista realizou inúmeras pinturas que retratavam a paisagem do Rio de Janeiro do século XIX, cuidadosamente representando a flora e a paisagem que gradualmente sofria modificações realizadas pelos assentamentos humanos. 

Apesar das modificações da paisagem, ao longo de mais de dois séculos, a artista foi tão certeira na escolha de seus enquadramentos, que até hoje podemos encontrar os mesmos pontos de vista nas fotografias de muitos turistas que passam pelo Rio de Janeiro.

Ainda que possuam naturezas completamente distintas, ambas maneiras de registar a realidade quando encontradas na internet, se apresentam como arquivos digitais, rapidamente difundidos na rede, e disponíveis para o consumo. Mesmo uma obra única como uma pintura, acaba sendo despida da sua materialidade ao circular pela rede na forma de imagens digitalizadas. Não se distingue portanto, das prosaicas fotografias captadas hoje em dia, e é igualmente consumida como substituto da experiência genuína de estar frente a uma pintura ou admirar uma bela paisagem. 

Depois de se apropriar destas imagens, o artista não adultera os “originais”. Porém, lhes sobrepõe uma malha geométrica que acentua o efeito simulado de imagens sintetizadas. Homogeneizando-as como pixels (partículas formadoras da imagem digital). 

A exposição conta com um grupo de 11 polípticos, que compõem um conjunto de cerca de 90 imagens no total. Através deste excesso, o artista pretende ainda representar as implicações da enxurrada de informação com que lidamos depois do advento da internet, simultaneamente fazendo um paralelo com a maneira como as obras de Marianne North estão em exposição permanente na sua galeria em Kew Gardens, Grã-Bretanha, preenchendo todas as paredes do espaço.

Texto para a exposição Sul x North, na Galeria Leme, São Paulo, agosto de 2015.